É sábado bem cedinho em São Paulo, dia 07 de julho de 2012, e nós, jovens do JÁ e do Treme Terra, encontramo-nos, com muita alegria e entusiasmo, para partir rumo à aldeia indígena Tenondé Porã, para mais um encontro de troca com o povo Guarani. Duas horas de viagem para chegar ao nosso destino, partimos de uma área urbana e central da cidade até uma área periférica e incrivelmente localizada na boca da mata atlântica litorânea, uma viagem de observar muitas cidades dentro desta nossa cidade São Paulo!
A chegada à aldeia é sempre cautelosa, gostamos de abrir os caminhos devagar, devagarinho; acredito que desde o início do projeto temos como importância deste intercâmbio cultural mostrar aos Gauarani que temos respeito a seu povo e sua cultura. Estar em contato com este povo, guardião de um saber ancestral há milênios, é o real intercâmbio cultural que podíamos almejar. Percebi que as atividades propostas no projeto são somente ferramentas para que isso aconteça, para que o real intercâmbio, feito de presença para compreender e vivenciar o outro, seja gerador de um encontro efetivo.
O momento mais precioso deste dia para mim, foi se aproximar da casa de Jera, grande representante do povo Guarani, a que possa chamar de nossa amiga, em que fomos guiados por crianças, que entre terra, árvores e lago realizavam o caminho de forma lúdica e livre: subir em galhos, pular barrancos e saltar com o corpo livre, sem medo e sem dúvida. Jera nos recebeu re-conhecendo, com certo cuidado para verificar quem éramos, mas sempre muito receptiva, abrindo sua casa como se estivéssemos ali já de longa data. Uma galinhada estava sendo preparada no fogo e o silêncio imperava naquela varanda, os Guarani sentados ao fogo conversavam entre eles de forma telepática, era uma leveza e limpeza no lugar. Eu, Carolina e Leonardo fomos os primeiros do grupo a chegar à casa, e pudemos compartilhar o silêncio sentados em frente a panela que cozinhava a galinhada, contemplando a comunicação Guarani, assistindo os pequenos gestos que mexiam o fogo, sentindo as palavras soltas que ora nos atravessava. Naquele momento, em que minha respiração se acalmou e sentiu o tempo daquele povo, compreendi que o mais precioso deste intercâmbio cultural são esses detalhes do convívio. É o cheiro que tem aquele lugar, é a maneira como aquela índia pegou o tacho para ascender seu petanguá, o modo que aquele índio sentou ao pé da porta, a história dos ancestrais que se houve em uma conversa cotidiana, o olhar atento daquela criança, o tom da voz daquela senhora, o artesanato pendurado na parede, o silêncio compartilhado sem medo de silenciar... São esses momentos, de muito silêncio, que me fazem compreender, ao menos um pouco, como é o imaginário cultural deste povo e, portanto, são esses momentos que fazem com que eu permeie, ao menos um pouco, seus mundos, um modo sutil e eficaz de fortalecer-nos, enquanto redes jovens, enquanto grupos culturais desta cidade, enquanto seres humanos.
Em silêncio,
Sábado, 07 de julho de 2012, estivemos novamente na aldeia guarani Tenondé Porã em Parelheiros, para o terceiro encontro do projeto Pra Tremer a Terra JÁ.
Estiveram presentes: Ronaldo, Luciano, Juliana e Tainá, integrantes do Grupo Treme Terra, Antônio que integra o Treme Terra e o JÁ e, Carolina Nagayoshi, Lilian Cardoso, Rafael Camargo, Thiago França, Débora Sanders, Maitê Freitas e eu, representando o JÁ - Juventude Ayahuasqueira da Porta do Sol.
Ao chegarmos, a primeira pessoa que encontramos foi nosso amigo Paulinho Karaí, irmão da Jerá, que nos encaminhou para falarmos com ela. Jerá nos recebeu muito bem em sua casa, e nos convidou para almoçar. O prato do dia era galinhada, um prato feito de arroz e frango, muito conhecido no interior do Brasil. Compartilhamos também as coisas que tínhamos levado e, comemos e conversamos de forma descontraída, estreitando os laços, nos conhecendo melhor uns aos outros.
Depois do almoço fomos para o campo de futebol onde estava acontecendo uma partida e Jerá nos contou um pouco sobre o povo guarani, a história da aldeia e compartilhamos impressões. Em seguida cantamos alguns de nossos cantos em forma de agradecimento e em retribuição por sermos sempre tão bem recebidos, e também porque, como no encontro anterior participamos do rito na Casa de Reza, ficou combinado que no próximo nós cantaríamos alguns de nossos cantos sagrados. Finalizamos com música e dança com a participação da própria Jerá.
O povo guarani é muito acolhedor, recebe muito bem os visitantes, e neste encontro se evidenciou o quanto a cultura deste povo permanece e resiste. Pois se, por um lado, não podemos nos ater a uma visão romântica e idealizada sobre o povo indígena, uma vez que não pararam no tempo, e o contato com outros povos influenciou e influencia sim a sua cultura; por outro, características muito fortes permanecem firmes. E alguém que tenha a oportunidade de se aproximar mais, enxerga sutilezas que revelam a força e a presença de uma cultura ancestral que permanece viva.
No geral, são pessoas muito atentas, observadoras, silenciosas, nem por isso, menos alegres. Entretanto, estas características propiciam entre elas uma comunicação quase que sem a necessidade de palavras, pelo olhar, pelo gesto, pelo pensamento, valorizando inclusive, a própria palavra quando esta se apresenta. Isso tudo proporciona uma atmosfera de serenidade e, têm-se a impressão de que até o tempo transcorre de forma diferente.
Um dos aprendizados proporcionados especificamente por este encontro, foi o de que as coisas são o que são.
Combinamos com a Jerá para que ela nos contasse sobre a aldeia e o povo guarani, então aguardamos um tempo até as coisas a nossa volta se acalmarem e o ambiente se tornar propício. Percebemos que poderíamos ficar ali infinitamente, sem que ela dissesse uma única palavra no sentido de compartilhar o que havíamos combinado, até que as condições fossem favoráveis, pois a lógica é outra. Não existe a rigidez de que só porque algo foi “marcado” tem que acontecer naquele horário, mas existe a disciplina, a postura, a conduta; se de fato os envolvidos querem que determinada coisa se dê, então... a disciplina em instaurá-la, então... ela é. Uma diferença sutil, mas ao mesmo tempo, muito grande.
Agradecemos a todos que nos tem proporcionado essa experiência, ao Teia Jovens, à Porta do Sol e à aldeia Tenondé Porá que se disponibilizou e se abriu para o encontro de forma tão generosa.
Leonardo Mussi (Conselheiro do JÁ)
Parabens pelo lindo encontro e continuidade ao projeto. Bjs a todos. Henrique Guimaraes
ResponderExcluir