Ata primeiro encontro

Ata dia 20 de março de 2012

Estavam presentes Henrique Guimarães, Juliana Schalch, Carolina Nagayoshi, Leonardo Mussi, Lilian Ganzerla Cardoso, Rafael Lemos e Rafael Camargo como representantes do JÁ e, Adonai Agni Assis e Ronaldo Gonçalves Alves como representantes do Treme Terra.
Local: Aldeia indígena guarani Tenondé Porã 
Conseguimos o apoio da prefeitura de São Paulo e da subprefeitura de Parelheiros, através da Lucia Belenzani (da subprefeitura Butantã) e Lilian Cardoso (representante do JÁ no Conselho da Juventude), para termos transporte gratuito (Van) da Estação Grajaú até a aldeia dos guaranis. Esse apoio evitou despendermos de uma grande parte de nossa verba, que estaria comprometida apenas com transportes.
Falamos muito sobre "saber chegar e saber sair". Henrique ressaltou que deveríamos chegar em “silêncio”, sem chamarmos atenção. Também ressaltou que, embora o projeto seja de caráter social, não é assistencialista, e que isso deve estar tão claro para os indígenas quanto para nós.
Nesse encontro tínhamos como premissa nos aproximar dos guaranis para organizarmos juntos o andamento do projeto. Não sabíamos mesmo como ia ser. Existiam expectativas baseadas no que já havia sido conversado na outra reunião e nas informações que possuíamos.
Foi ressaltado que o plano todo não consiste em simplesmente darmos nossas ideias, nossas influências, nossa cultura e realizarmos eventos na aldeia. O plano é fazer em conjunto. Demos os primeiro passo, de ir até lá e buscar essa aproximação, mas isso não significa dizer que a realização do projeto como um todo será de forma unilateral. Em suma "tocaremos o barco", por termos nos colocado nessa posição de "puxar" o projeto, mas nada será imposto, ou colocado sem que haja conversa com os índios.
Fechamos o cronograma em 6 encontros. O Encontro Zero foi o primeiro contato que tivemos. A segunda visita, de 20/03/2012 (terça-feira), consideramos como o 1° Encontro, onde conversamos sobre os valores sociais, morais e culturais, e fizemos paralelos da vida da comunidade indígena guarani com a sociedade urbanizada. Haverão outros 5, dos quais o 5° e o 6° encontros serão uma espécie de finalização do que foi o projeto. No 5° Encontro faremos algum "movimento" dentro da aldeia, provavelmente um tipo de show ou apresentação. O 6° e último encontro, será em Mairinque onde apresentaremos todo projeto aos Membros da Porta do Sol. Ainda discutiremos e planejaremos o que será feito.
Ao chegarmos à aldeia notamos que houve uma constante "leitura" feita pelos índios em relação a nós, tão logo nos apresentamos e fomos recebidos. Eles se comunicavam em português e ao nos aproximarmos conversavam mais em guarani entre eles. Apesar disso, os índios se mostraram muito amistosos, e nos primeiros momentos já nos incluíram em suas atividades. As mulheres estavam sentadas no chão, em cima de uma espécie de tapete, fazendo "cestinhas" de palhas de bambu; um outro índio estava fazendo chapéu de palha; outros raspando bambu e por fim outros separando a casca do miolo do bambu. Nos juntamos a eles, e eles foram nos ensinando. Conversamos sobre essa experiência em específico, e a Juliana Schalch conseguiu definir em poucas palavras a forma de aprendizado a qual aqueles índios lecionavam: Postura e Telepatia. Em muitos momentos percebemos que estávamos sendo observados. Aqueles olhares investigativos, porém disfarçados, buscavam descobrir em nossas atitudes e palavras qual era nossa "carta de intenções", para que ficasse cada vez mais claro o que estávamos fazendo lá e o que queríamos com eles.
Quem nos recebeu foi o guarani Claudio que dá as oficinas e é também professor de educação física na escola local. É uma pessoa muito comunicativa e receptiva. Demonstrou bom humor com a nossa presença, e nos explicou um pouco sobre a cultura guarani e seus costumes.
A colônia de Parelheiros tem em torno de 1100 índios. Os índios vivem em acomodações não precárias, em casas de alvenaria e possuem eletricidade. Apesar disso reclamam do saneamento básico e ressaltam a escassez da água, bem como sua baixa qualidade.
Sobre a educação nos disse que as crianças de 0 a 6 anos estudam em uma escola específica e aprendem apenas a língua guarani, depois vão para outra escola de ensino médio. Nessa escola há outros professores de fora (não- índios), que lecionam matérias como química, matemática (...), porém essa escola é indígena também, e nela eles tem contato e aprendem o português. Ele disse que foram muitos anos de "luta" para reivindicar uma escola para os índios. Afirmou que por diversas razões, inclusive preconceito, não há condições de índios estudarem com não índios. Além do mais, os guaranis passam a muitos séculos procurando manter sua cultura e tradições. Então, se logo cedo os índios se distanciarem de seus costumes, esses conhecimentos podem ser mais abalados, e por fim, perdidos. Em alguns momentos Claudio dava risada das crianças brincando na aldeia e fazia algumas comparações com os não-índios. Uma das situações foi a de uma criança em cima de uma árvore, e ele disse que se fosse na cidade, os pais estariam brigando, e que na cultura deles você deixa as crianças “soltas”. Inclusive, disse “pode deixá-las a uns 3 km da aldeia, uma hora elas voltam, nunca aconteceu nada.”
Sobre suas crenças, nos apresentou a OCA, que é um lugar sagrado para eles. O que nós do grupo sentimos que foi uma grande abertura, demonstrando um sinal de respeito, pois ele ressaltou: “Essa é nossa OCA, um lugar sagrado para nós.” Ali dentro havia um altar com penas de uma certa ave, fazendo o formato de uma semicircunferência e ele nos explicou que era simbolizando o nascer do Sol. Haviam também alguns instrumentos utilizados nos rituais como a rabeca (espécie de violino), violão (mbaraka), chocalho (baraka mirim), um desses instrumentos é a segunda parte do nome do Claudio. Alguns desses instrumentos sagrados só podem ser tocados por homens. A erva mate para eles é sagrada, e existe um ritual no qual fazem seu batismo. Apresentou o Petyngua espécie de cachimbo artesanal utilizado no cotidiano e em rituais. O uso pode ser feito por crianças, homens, mulheres e dizem que é costume os visitantes chegarem na aldeia e fumarem um pouco, para se “familiarizarem”. Falamos sobre alguns dos rituais, dentre os quais:
- O matrimônio; o batismo (nascimento), em que o Pajé nomeia a criança;
- Ritual de passagem dos homens, jovens que no período de mudança da voz, têm sua boca furada abaixo dos lábios. No furo colocam uma “madeirinha”, isso causa dor nessa região então o jovem passa a falar menos;
- Ritual de passagem para mulheres, na primeira menstruação as meninas ficam em confinamento por certo período;
- Ritual de Restrição Alimentar feito pelos pais. Assim que nasce a criança, ficam em torno de 40 a 60 dias sem comer carnes.
- Ritual de Batismo da Folha do Mate, que é um dos mais importantes;
Entre outros rituais.
Os guaranis são abertos a visitação e acomodações (moradia) de outros índios que seguem semelhante linhagem, inclusive havia uma indiazinha quéchua, que falava espanhol além de seu idioma raiz. O mesmo não ocorre com o não-índio, esse pode até ficar alguns dias, mas não pode morar. Apesar disso existe um ritual de batismo, onde o não-indio que é bem recebido e participa ativamente das atividades da comunidade, recebe um nome guarani dado pelo Pajé.
Ainda a respeito das crianças, falávamos sobre o batismo. O Pajé dá o nome guarani de batismo às crianças, dizem que ele conversa com o espírito e o mesmo conta o nome. Um dos índios, Everton (20 anos), disse que seu espírito não falou seu nome, então ele recebeu apenas um nome genérico. Claudio explicou que para os guaranis existem em torno de 6 nomes masculinos e 6 (ou 7) femininos, com variações no final, que complementam o sentido do nome.
Falamos também sobre as questões de saúde pública como o uso de drogas, principalmente o álcool. Alguns índios são alcoólatras em virtude desse contato com os centros urbanos. Contaram o caso de uma morte que ocorreu como resultado dessa problemática. E que essa questão estava trazendo muita infelicidade para a tribo, mas que o problema esta se amenizando agora. Ainda nesse sentido, falamos sobre os postos de saúde. No posto de saúde reivindicado por eles na região, existem alguns médicos que, embora mediquem e tratem das doenças dos pacientes pela medicina ocidental, respeitam a opinião dos pajés nos tratamentos. Os pajés geralmente tratam as doenças de cunho espiritual. Gripes por exemplo, eles mesmos indicam os postos de saúde, dependendo do caso. Há uma harmonia nessa relação. Percebe-se que são um povo acolhedor e da paz, não gostam de conflitos nem de “xeretas”. Em dado momento Claudio fez uma crítica aos seguidores de certas religiões que vão até lá para impor suas crenças e ofendê-los. Ele nos contou um episódio em que um dirigente de uma Igreja o ofendeu chamando aos índios de capeta, pois eles não aceitavam Jesus. Claudio respondeu com humor, que se Jesus tivesse nascido entre guaranis, estaria vivo até hoje.
 
Sobre a atenção da sociedade, falamos sobre o mês de abril, "mês do índio", é o mês em que mais recebem visitas. Ele afirma: “Parece que algumas pessoas só lembram da existência do índio nesse período, ou no dia do índio, e no resto do ano caem no esquecimento.” Inclusive nos informou que o dia 19 de abril não é uma data comemorativa para eles, e que é na verdade uma data de luto, pois muitas vidas de índios foram perdidas.
Claudio reclamou da postura do governo em relação aos índios. Ele diz que é como se o governo achasse que eles não sabem respeitar a natureza, e que são destruidores em virtude de serem conhecidos como nômades. Ele defende dizendo que respeitam muito a natureza e mantém uma relação harmônica com ela, por eles a conhecerem. Também foi falado da falta de matéria prima para a realização de seus instrumentos ritualísticos, de caça e para fazer ferramentas.
A medida de tempo deles funciona da seguinte forma, Ano Novo (equivalente a nossa primavera e verão) e Ano Velho (outono e inverno). Nesses períodos eles alternam as formas de se alimentarem. Em certa época não podem comer peixe e tomar leite, esse é um dos exemplos.
Falamos sobre a questão do lixo e observamos que não é tão distante de nós. Existe certa quantidade de lixo espalhado, principalmente restos de frutas, mas não há excessos e imundice. O Claudio disse que todos são educados desde pequenos para que separem o lixo comum, orgânico e reciclável. A questão está na coleta, que não sabemos se é feita de forma correta pelas empresas coletoras, semelhante problemática que vivemos atualmente na Porta do Sol.
No caminho de volta, trocamos nossas impressões e experiências do que havia sido esse 1° Encontro – uma espécie de Roda de Ética. Ressaltamos também a questão da carência da presença da frente do meio ambiente. Embora o Leo Mussi tenha sido incumbido pelo Thiago França (meio ambiente), para coletar e repassar as informações, como um “suplente”, essa situação ocorreu como exceção. Isso porque a intenção é que todas as frentes estejam presentes nos encontros. Por fim, foi comentado que haveria uma demanda em camisetas para o projeto, e eu, Rafael Camargo me prontifiquei em verificar com um amigo, e depois passar as cotações, para saber a viabilidade.
No desfecho, falamos sobre a criação do blog. Em vista de termos nos comprometido com o edital em criar uma plataforma eletrônica via blog para o registro deste projeto. O blog será aberto aos participantes do projeto para que coloquem material referente ao que tem sido feito e o que o será realizado. No site da Porta teremos um link para esse blog.  Então ao mesmo tempo em que o blog está conectado com a Porta, também servirá como uma espécie de “prestação de contas” do projeto para fora. Além do mais, os índios têm celulares e acesso a internet, então com esse blog poderíamos estreitar ainda mais nossas relações, trabalhando para que haja uma interação não somente nos dias dos encontros, e quem sabe o projeto pode rumar para proporções maiores em próximos editais. Lilian Ganzerla Cardoso se prontificou para fazer o fazer o blog.
Quando estávamos de partida o índio Paulo, que realizou a primeira caminhada do JÁ na Terra Sem Males (Peabiru) há alguns anos atrás, apareceu quase no final da nossa visita, pois estava em outro compromisso. Ele ficou muito feliz em nos ver, e nos saudou. Ao final do encontro presenteou o JÁ com uma linda escultura de madeira feita a mão por ele. No momento da entrega da escultura:
Henrique: - Que legal, é uma ave! Que ave é, um Falcão??
Paulo: - Não! É uma Águia! Símbolo da PERSISTÊNCIA E DA PERSEVERANÇA.
Encerro com a explicação feita pelo Leo Mussi, que explica o significado da águia ser símbolo de persistência e perseverança. “Quando a águia chega a uma certa idade, ela fica com as unhas moles e com o bico curvado, as asas ficam pesadas e as penas velhas, dessa forma já não consegue se alimentar direito. Então ela voa para o alto de uma montanha, faz um ninho, e quebra seu bico batendo na parede. Quando o novo bico nasce ela arranca suas velhas unhas. Quando as unhas novas nascem ela tira as penas velhas. E após isso, o ciclo de renovação da Águia está completo. É um Renascimento, Igual a Fênix.”
Rafa Camargo 21/03/2012









Nenhum comentário:

Postar um comentário